Herdamos a Festa do Divino dos portugueses, mas o folclore europeu adaptou-se à realidade brasileira e deslocou-se no calendário, tornando-a polarizadora de várias festas populares principalmente entre os paulistas. Faz parte do folclore dos bandeirantes. A respeito da cerimônia, ouvimos o saudoso Antônio de Arruda, conterrâneo, respeitável cidadão, católico, participante da Irmandade, um pouco antes de seu falecimento. O seu depoimento,a seguir, é um registro exclusivo, curioso e elucidativo:
“ Eu vou contar como começou a Irmandade do Divino Espírito Santo por aqui. No começo, a festa do Divino Espírito Santo era diferente; os homens católicos, de idade mais avançada, dirigiam-se à capela onde era realizada a festa. Ali eram expostas as bandeiras e aquele que quisesse poderia pegar uma bandeira e sair com ela o ano inteiro, visitando as casas de famílias e ainda poderia receber ofertas e gratificações. Uma porcentagem da arrecadação era para a festa e o restante era utilizado para as despesas feitas durante o ano. No mês de abril, todas as “bandeiras” se reuniam num determinado local, onde se realizava a festa, quando faziam a entrega de uma importância (que era a comissão) para a Igreja. Ao término da festa, quem quisesse, poderia pegar novamente a bandeira. Era o costume da época nas redondezas de Tatuí, Conchas, Anhembi, etc.; eram os bandeireiros, os que costumavam sair com as bandeiras, mas curiosamente nenhum deles cantava.
Então, apareceu um deles, chamado por João Ferreira, que tinha um casal de filhos – Claudino Ferreira e Maria Ferreira – que também pegavam bandeiras e, então, tiveram a idéia de ir até as casas e cantar, saudando o dono e a família. Até que um dia, aconteceu um milagre. Existia um casal bastante jovem, sendo a mulher paralítica em decorrência de um parto mal sucedido. O marido fez um pedido ao Divino Espírito Santo para que sua esposa sarasse e, caso fosse atendido, o primeiro bandeireiro que ali chegasse seria recebido com uma festa. O pedido foi atendido. O primeiro a chegar foi João Ferreira, que cantou e saudou todos da casa. Ali pousou e orou pelo cumprimento da promessa. Reuniu muita gente, porque ficaram sabendo do milagre e, então, o povo se “agarrou” com mais fé ao Divino Espírito Santo. Comprovado o milagre, o bandeireiro João Ferreira, que também castigava aqueles que não se comportavam a e abusavam da fé, dirigiu-se para a casa de outro casal, onde somente a esposa se encontrava e ele cantou para saudar a família. A mulher recebeu a bandeira com muito carinho porque era muito religiosa. O bandeireiro pediu comida e ela disse que iria preparar. Pegou um frango que estava cantando e o matou, para fazer a comida o mais depressa possível. O marido, que não acreditava no milagre do Espírito Santo, estava trabalhando e quando chegou ela lhe contou que tinha recebido a bandeira e que estava preparando o almoço, daí ter matado o frango. O marido irritado começou a discutir e a maltratar a esposa; uma briga que se estendeu até a noite. Quando chegou a meia noite, escutou um frango cantar e ele assustado parou de amolar a mulher. No dia seguinte, levantou cedo e quando abriu o portão, o frango apareceu na sua frente e cantou outra vez. Diante do ocorrido, ele ficou muito nervoso e a partir daí começou a acreditar e pediu perdão à sua mulher.
O fato aconteceu, foi muito comentado, mas com o passar do tempo, o sistema de bandeireiro foi se modificando. Faleceu João Ferreira, mas os seus discípulos levaram adiante o festejo. Resolveram então buscar a ajuda das paróquias, transformando o grupo em Irmandade. No início viajavam a pé; hoje viajam de caminhão. Os padres, visando melhorar a organização, pediram às diretorias das irmandades que organizassem comissões. Agora, existem 3 Irmandades importantes do Divino Espírito Santo: Irmandade de Anhembi, Irmandade São João, Irmandade Capela de São Sebastião. A Irmandade do bairro da Capela de São João tem diretoria completa. É formada pelo diretor Tonico Rosa (que usa a palavra do Santo Evangelho); o diretor é Julião Venâncio; o vice-diretor é Jaciro e o presidente Aparecido Gomes, Existem dois capelães: Lázaro Soares da Silva e Antônio de Arruda. A festa do Divino Espírito Santo começou há muitos anos atrás, mais ou menos, em 1882”.
Júlio Manoel Domingues
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