“Neste ano de 2016, que os cientistas destacam como “o ano da realidade virtual”, se ele aqui estivesse, completaria 100 anos de idade e, certamente, seria um fato histórico para os familiares e àqueles que o conheceram e privaram de sua amizade”. (Julio Manoel Domingues).
Filho de Fadel Jacob Fadel e Mari Saad Fadel nasceu em Hamat, Líbano, em 18/07/1916 e faleceu em Conchas no dia 09/05/1992, com 75 anos de idade, sendo sepultado no Cemitério de Porangaba. Casado com Laurinda Maraccini Fadel, filha de José Maraccini e Ursulina Meucci Maraccini. Deixou filhas, genros, filho e netos. Foi uma figura carismática, cativante e singular; um homem franco, honesto e de elevado caráter.
Não foi o primeiro árabe a morar por aqui; muito antes, já viveram outros, mas, foi o que mais se adaptou, cativou e é lembrado com muito respeito pelo seu caráter e sociabilidade. Adotou Porangaba. Os moradores mais antigos, sem exceção, lembram-se com muito carinho do seu “Elias Turco”, da dona Laurinda e da loja. Foi, sem dúvida, o comerciante que mais se destacou no comércio local na segunda metade do século passado. As lojas de tecidos sempre existiram na cidade e eram conhecidas como lojas de fazendas. Portanto, tivemos grandes lojas e destacados comerciantes, mas cabe o registro especial à casa de “tecidos e armarinhos, etc”, do saudoso libanês.
Veio muito jovem para o Brasil e após trabalhar algum tempo em Pardinho e Laranjal Paulista com seu irmão mais velho, chegou em 1939 a Porangaba e montou a Casa Brasileira, que comandou por mais de 50 anos, junto com a esposa Laurinda Maraccini, filha de italianos, com quem se casou em Laranjal Paulista em 1941. Aqui formou sua família. Hábil e inteligente negociante forneceu aos fregueses, indistintamente, produtos da melhor qualidade, vendendo a prazo aos sitiantes para pagamento nas colheitas.
Figura ímpar, no seu linguajar característico de árabe, às vezes temperamental, outras vezes dócil e até ingênuo, participou da vida social da comunidade com bastante destaque. Em Laranjal praticou esportes e se destacou como jogador de “basquetebol”. Em Porangaba foi Presidente do Clube Recreativo 21 de Abril, sócio fundador da Corporação Musical Santa Cecília e da Santa Casa de Misericórdia. Líder natural das pessoas da zona rural, que lhe confiavam a guarda de valores (que permaneciam no seu cofre), e buscavam orientação para negócios, conselhos, mediação, etc. Era bastante comum a chegada de cartas daqueles que haviam migrado, principalmente, para o norte do Paraná nos anos 40, aos seus familiares que aqui viviam nos sítios e fazendas, sempre endereçadas aos cuidados do “Elias Turco”, que fazia a entrega. Uma deferência enorme. Foi honrado também pelo compadrio e apadrinhamento, envolvendo inúmeras famílias porangabenses. Pode se dizer que com sua morte foi virada uma página da história das relações sociais e do comércio varejista de Porangaba.
Por que “Elias Turco”? Na verdade, o apelido nasceu de forma natural, no meio do povo, de seus fregueses e amigos, na época em que os libaneses eram confundidos com os turcos, os chamados mascates que atuavam no interior paulista vendendo mercadorias de porta a porta. Aceitou naturalmente a alcunha e parece que até gostava do chamamento. Sempre tranqüilo, fumando o seu cigarrinho de palha, progredindo em razão de seu elevado tino comercial e consolidando sua posição de liderança no comércio local. Sua loja era referenciada, situada à rua 4 de Junho ( antiga rua do Comércio ), em prédio próprio e que até hoje existe; foi sem dúvida a casa comercial mais importante do município pela variedade e qualidade dos produtos comercializados. Vender bem e com preço bom era o seu lema.
“Os libaneses sobreviveram e prosperaram graças às suas relações livres com o resto do mundo, pois a sua terra natal, apesar das belezas, era restrita e árida, desprovida de riquezas naturais como o ouro e o petróleo. Como cita Georges Buis em La Barque: “Este País nada produz alem de seus habitantes, mas que príncipes da mente”. Os sírios e libaneses, confundidos com os “turcos”, começaram a chegar ao Brasil no final do século 19, fugindo das dificuldades econômicas em seus paises de origem. Vieram, principalmente, para o Estado de São Paulo. Dedicaram-se ao comércio, no início como mascates, percorrendo com suas mercadorias as ruas das grandes cidades, fazendas e pequenas cidades do interior. Aos poucos, abriram suas próprias casas comerciais, tornaram-se industriais, subindo os degraus da mobilidade social. Seus descendentes, então, já diversificaram suas atividades, com notável concentração na medicina, engenharia e atividades políticas. País com uma diversidade natural, religiosa e cultural enorme, contou com a participação de diversos povos na formação de sua história. Primeiramente, os fenícios, hábeis navegadores que criaram o alfabeto. Libaneses ou turcos? Por que os primeiros imigrantes árabes eram assim chamados? Dominados pelo Império Otomano, os libaneses conheceram as privações e a pobreza. Só podiam viajar com passaportes de autoridades turcas; o passaporte do opressor naquela época. Os libaneses foram então chamados de turcos, de acordo com o passaporte e ficaram marcados pejorativamente. Embora fosse desprestígio, muitos aceitaram naturalmente o apelido, não ligaram e, com o tempo, tudo foi esquecido. Com a queda do Antigo Império Otomano, a Turquia tornou-se um país moderno e progressista. Por outro lado, hoje, os sírios e libaneses orgulham-se de suas origens e não se sentem desprestigiados ao ser chamado de “turco”. (Fonte: Boris Fausto em “História do Brasil”, Edusp 1995).
Foto: “Elias Fadel Fadel”, acervo pessoal.
Júlio Manoel Domingues
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