Ao estudar o crescimento demográfico de Porangaba, notamos que, dentre os imigrantes europeus que aqui chegaram, os espanhóis formaram um grupo relativamente pequeno. Não foram muitos, mas fizeram história e um deles merece citação especial: o Sr. Ciro Alonso, comerciante de aves e ovos. Pessoa de fino trato, de fácil relacionamento, logo que veio de Pereiras, provavelmente no início dos anos 30-40 do século passado, optou por essa atividade comercial e seguindo os ditames da época, progrediu e se tornou conhecido principalmente entre os seus clientes e fornecedores cuja maioria vivia na zona rural; pequenos sitiantes e agricultores.
Com respeito às suas atividades, era uma prática de comércio bastante antiga e, na maioria das vezes, baseava-se na troca, barganha ou escambo ( sistema onde a própria mercadoria funcionava como moeda ); Foi uma atividade que existiu na zona rural até, mais ou menos, o último quarto do século passado. Os compradores se deslocavam a cavalo para sítios e fazendas a fim de comprar aves e ovos, indo de porta em porta . Era costume adaptar dois cestos ao arreamento do animal, um de cada lado, onde colocavam as mercadorias para a troca e, também, acomodavam os produtos que iam adquirindo. Levavam, além de dinheiro, pães, balas, guloseimas e alguns produtos de armarinho (linhas, agulhas, botões, etc.), que funcionavam como as “moedas” preferidas. Esses negociantes costumavam prestar outros serviços aos sitiantes, aumentando assim o grau de sociabilidade que mantinham com os fregueses, comprando medicamentos, postando cartas, transportando dinheiro e outras encomendas.
Sua integração social foi rápida, pois tratava-se de pessoa respeitável, correta no seus inúmeros contatos comerciais, daí a confiabilidade. Tinha muitos amigos e a todos tratava com cordialidade e respeito. Eu, bastante jovem, curioso, o conheci nos anos 50 e me incluí entre os seus interlocutores, pois, nas inúmeras conversas que tivemos, sempre aprendi alguma coisa e o admirava. Quando eu me dirigia ao sítio de meu pai, que ficava na caminho dos Polis, na estrada de Torre de Pedra, passava ao lado de sua propriedade que tinha adquirido do Sr. João Afonso Pereira. O local, onde ficava a chácara, parece-me que hoje se chama Vila São Luiz e está totalmente modificado. Grande parte das moradias ali existentes foram demolidas, inclusive a sua, para seguir o novo traçado da rodovia que por ali passava.
Uma curiosidade: Era em sua propriedade que se encontrava o poço da “Água Boa”, o mais concorrido e procurado da cidade, onde a população se servia de água potável e também a usava para a lavagem de roupas. Ao passar por ali, sempre que o via, eu “apeava” do meu cavalo para bater um papo. Era saudado e muito bem recebido. Atualizado, estava sempre informado de tudo que acontecia pela leitura dos jornais da época e, como bom espanhol, politizado, questionava muitas coisas e queria ouvir a opinião de um jovem estudante. Chamava-me carinhosamente de “ Julinho”. Então, ficávamos por algum tempo em entretidas conversas, abordando os mais variados assuntos da atualidade, temas diversos, que nos entretiam e esclareciam. Saneava todas as minhas curiosidades e ainda dava conselhos importantes para o meu aprimoramento cultural. Era um homem muito elegante, culto, íntegro e respeitoso, com o qual eu gostava de conversar.
Fiquei sabendo que viera de Pereiras para Porangaba. Foi casado com dona Carolina Casali Alonso, sua 1ª esposa. Aqui, ao iniciar as novas atividades, hospedou-se na Pensão do Luiz Padeiro ( Luigi Biagioni ). Depois de algum tempo, casou-se pela 2ª. vez, com dona Ovídia Miranda, de família porangabense, neta do Capitão Joaquim Francisco de Miranda. Desse segundo casamento nasceram 2 filhos: Maria Célia e Geraldo, além do filho mais velho de seu 1º casamento, Geraldo Alonso (1925-1988), um dos mais conhecidos publicitários brasileiros; pioneiro, criador em 1946 da Norton Propaganda; a Agência de Publicidade que se manteve por décadas entre as maiores do mercado nacional, protagonizando alguns dos momentos importantes da história da publicidade no Brasil.
Foto: “Vista da Propriedade do Sr.Ciro Alonso”. Arquivo digital, acervo pessoal.
Júlio Manoel Domingues
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