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31 de outubro de 2017 - Memória – Dionísio Parga, “O Espanhol”

Existem muitas histórias sobre o povoamento de Porangaba, a partir de 1870, que chegam até a nos surpreender pela riqueza de detalhes, como por exemplo, a chegada dos primeiros estrangeiros europeus ( portugueses, espanhóis e italianos) na Bela Vista de Tatuí. É evidente que não encontramos de pronto razões plausíveis, aparentes, que justifiquem esse movimento migratório para uma região pouco ou quase nada desenvolvida na citada época, e que muito pouco poderia lhes proporcionar, mas se vieram, certamente tinham motivos suficientes. A maioria era constituída por agricultores, mas boa parte se fixou no comércio (comerciantes, artesãos, pedreiros, etc. ) e contribuiram para o desenvolvimento do povoado. O que podemos afirmar com segurança é que a situação política e financeira dos países de origem, na época, era totalmente desfavorável, a par da recessão econômica. A verdade é que tudo começou com a imigração para a Província de São Paulo, a partir de 1870, com a chegada dos europeus para substituir a mão de obra escrava. Mas, a vinda ininterrupta, principalmente dos italianos, começou mesmo, a partir de 1882. Era o início da imigração subvencionada, com grande êxito, cujo sucesso foi atribuído aos esforços de Queiroz Teles, Visconde de Parnaíba, que mais tarde (1886/87) assumiu a presidência da Província de São Paulo. Incentivou a formação de um novo órgão promotor de imigração, construindo na cidade de São Paulo a “Hospedaria dos Imigrantes”, para receber os estrangeiros, com dormitórios, refeitórios, enfermaria e lavanderia, onde os recém chegados poderiam alojar-se gratuitamente por uma semana até que fossem direcionados para as fazendas. No ano de 1888 chegou a acomodar 4.000 pessoas e insistiu com os fazendeiros para que oferecessem habitações limpas e saudáveis aos seus colonos. Até mais ou menos 1895, a maior parte da imigração de classe inferior era subvencionada e destinada às fazendas.

 

No caso em questão, consideremos o espanhol Dionísio Parga que fez história em Porangaba. Infelizmente, não conseguimos encontrar uma única foto do ilustre personagem para publicar. Não era um imigrante comum; veio com a esposa Romana e era homem de dinheiro, tinha recursos. Veio por conta própria; chegou e montou sua base. Construiu sua moradia, comprou terras e se tornou um produtor agrícola respeitável, muito conhecido e procurado. Morreu, relativamente cedo, no ano de 1935, mas eu me lembro muito bem de sua esposa dona Romana. Com a morte do marido, no início dos anos 40 ela retornou à Espanha.

 

O saudoso Urbano de Miranda, ao escrever sobre as figuras ilustres de Porangaba, disse o seguinte sobre o Espanhol:  “Pessoa respeitável e empreendedora. Homem culto, de recursos, fazendeiro, produtor de café e algodão. Como veio parar em Porangaba, melhor na Bela Vista de Tatuí? Jamais saberemos. Por motivos óbvios, chegou até simplificar o nome. Chegou à aldeia do Rio Feio por volta de 1900 e, em seu túmulo, em Porangaba, consta a data de seu falecimento; 1935. Casado com Romana, que retornou à sua terra natal, bem velhinha, onde veio a falecer. Procedentes da bela cidade de Barcelona, nordeste da Espanha, uma das mais lindas cidades da Europa. De Barcelona para o povoado do Rio Feio. As indagações. Por que? Os motivos? Dá para entender? “Sabeime” lá. Penúria? Essa, garanto que não. O único estrangeiro rico a apear na aldeia. Trocou as pesetas, ainda em Santos, por muitos mil réis. Doou o altar-mór à Igreja, em mármore de carrara; comprou muitas terras perto da Mina. Plantou café. Lembro-me de seu Ford 1929, cor café com leite. Nos dias frios um martírio; motor ligado à manivela. Só funcionava no tranco. Generosos, eram um casal sem filho, batizou dezenas de crianças, inclusive minha irmã Maria Amália. Todos em casa os chamavam de padrinho e madrinha. Eu, ainda menino, vivia enfiado em sua casa. Ali aprendi a gostar de frutas secas, goles de bons vinhos, especiarias européias e, pasmem, distinguir um quadro de pintura de uma gravura. Enfim, recebi dos meus padrinhos um bom verniz no meu caboclismo. Padrinho gostava e lia sempre “El Madrileno” e “O Estado de São Paulo”, inclusive revistas diversas recebidas da Europa. Um curiosidade. Seu nome completo: Dionísio Parga Bossetta, Já na aldeia, retirou o sobrenome Bossetta. Não soava bem. Claro que não! Da Espanha para o Rio Feio, também vieram os irmãos José e Domingos Martins, Antônio Aires (Salgado), nomes retirados dos escaninhos da memória. Na minha última visita ao cemitério de nossa Porangaba coloquei flores sobre o seu túmulo”. (Fonte: “Eu e Os Tempos Antigos de Porangaba” , Urbano Miranda)

 

Foto: “Barcelona, Spain” de Benjamin Voros at https://unsplash.com/photos/oJsRqwMHWHI

 

 

Júlio Manoel Domingues

 

 

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