Conversando com alguns moradores de Porangaba, amigos ali nascidos e criados, lembramos de fatos interessantes que marcaram o cotidiano do nosso povo e de nossa infância. Muitas lembranças afloraram, envolvendo os usos e os costumes e, dentre, todas, uma foi bastante curiosa. Perguntou-me o Joaquim, filho do Nicanor do Valêncio : “Você se lembra da “carrocinha” da Prefeitura que transportava carne do matadouro para os açougues da cidade?” “Claro”, a resposta foi imediata. Dias depois, ao me lembrar do ocorrido, fui buscar nas minhas lembranças outros fatos relacionados e, então, resolvi registrar: O transporte através de carroças puxadas por muares, até meados do século passado, era comum em Porangaba. Grande parte dos sitiantes e, também, de negociantes tinham suas carroças aparelhadas para os mais variados serviços. Além disso, para suprir a demanda existiam também os carroceiros autônomos que atendiam as necessidades da população. A Prefeitura Municipal, através da área de serviços gerais mantinha carroças e parelhas de burros para atender serviços essenciais, como a coleta de lixo e o transporte de carnes do matadouro municipal aos açougues da cidade. Essa última atividade durou, seguramente, até a metade do século passado. Hoje, a sistemática é outra.
Antes, no bairro do Rio Feio, o abate de bovinos e suínos para consumo era feito pelos próprios comerciantes através dos picadores de carne; não existia, o matadouro e nem açougues. A maioria dos comerciantes vendia carne e banha de porco aos seus fregueses, já que abatiam regulamente suínos nas suas próprias casas, onde mantinham, principalmente, as mantas de toicinho e outros produtos derivados. Citaremos alguns comerciantes que certamente venderam carne de porco: João Machado da Silva, , Demétrio Tertuliano, Amadeu Ribeiro, Antônio de Pádua Fiuza, Antônio Nunes da Silva, Domingos Nunes da Silva, Bento Cândido, Raphael Pássaro, Giocondo Rossi, Giocondo Biagioni, Luiz Biagioni, José Antônio de Medeiros,etc.
Segundo Pedro Eduardo de Felício, médico-veterinário, professor da Unicamp: “Até o surgimento da indústria frigorífica no Brasil, na década de 1910, prevaleciam no país as charqueadas primitivas e os matadouros faziam o abastecimento local de modo bastante precário. Faltavam cuidados, especialmente higiene, o que colocava em risco a saúde dos consumidores. As charqueadas e matadouros municipais foram importantes no abastecimento, atendendo as necessidades da época e produziam para o consumo imediato. O consumo de carne bovina nas pequenas comunidades e povoados do território paulista, até meados do século passado, dependia, portanto, exclusivamente dos matadouros municipais, na verdade, onde existiam.”
“E o que acontecia por aqui e lembramos muito bem da carroça, puxada por burros, que transportava as carnes aos açougues, conduzida pelos saudosos funcionários municipais: Beraldo, Ermelindo (Melo) e Dito do Amador, etc. A “carrocinha da carne” subia lentamente a estradinha, carregada com os bois abatidos de madrugada, com destino aos açougues do Eurico Fogaça, Henrique Pinto e Juvenal Ribeiro. Tudo era improvisado, uma carroça em forma de baú para proteger a carne do pó da estrada. O matadouro ficava na periferia do povoado e era onde alguns corajosos costumavam ir de madrugada para beber o sangue, ainda quente, do boi abatido, na crença de conseguir uma saúde de ‘ferro’.” (Fonte: Urbano Miranda, Crônicas).
Complementando, não sabemos quando foi instalado o primeiro matadouro no município; é possível que tenha sido logo após a emancipação política. Ouvimos dizer, também, quanto à localização, que no início o abate era feito ao lado do ribeirão São Martinho, que passa pela cidade, nas áreas ribeirinhas que hoje pertencem à Família Fernandes e, também, à professora Vera Miranda. Com o passar dos anos funcionou em outros locais, até ser instalado na Av. Cristino Manoel de Miranda, em terreno da municipalidade, onde permaneceu por muitos anos, já contando com os recursos de energia elétrica e da água encanada. Hoje, o local onde existiu o matadouro é utilizado pela Prefeitura como garagem e o abate de bois, vacas e porcos, etc., para o consumo, por força de lei, é uma incumbência exclusiva de frigoríficos credenciados e mais estruturados de centros maiores e que ainda também fazem a entrega das carnes encomendadas e selecionadas aos açougues e super-mercados da cidade. Tudo mudou.
Foto: “Ham Factory” by savit keawtavee em http://www.freedigitalphotos.net/images/Manual_jobs_g397-Ham_Factory_p24658.html
Júlio Manoel Domingues
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