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14 de abril de 2013 - Recordando os Tipos Populares

Nas vilas, povoados, bairros, pequenas e grandes cidades, em toda parte enfim, sempre encontramos os tipos populares que, independente do nível cultural e sócio-econômico, são pessoas  rotuladas como curiosas, grotescas,  inconseqüentes, até maníacas e que chegam a ser  agressivas, mas, muitas  vezes são ingênuas e pacíficas. 52  Na maioria, inofensivos, mas, via de regra, são sempre  alvos de chacotas e caçoadas da criançada e de muitos adultos. Quando provocados, têm as mais variadas reações, do grotesco ao hilariante, do cômico à agressão, uma xingação danada. Passada a tormenta, na calmaria, todos têm a sua historia para contar e, então, alguns mostram um certo grau de cultura, polidez e educação. Alguns nomes que fazem parte do folclore de  Porangaba: Norinho, Salvador Vaca, Maria Vermelha, Zé Lima, Bento Mimi, Pedro Cavalheiro, Joaquim Baiano, Maria Cotó, Joaquim da Costa (do bairro dos Mariano),  Trajano, Jesuino, Maria Gato ( morava com a nhá Tomázia, era lavadeira e a torradeira de café mais requisitada),Surdinho, Chico Peludo, Amador Florentino, Larico, Avelino Albino, Nhá Eulália, Francelino da Barra (solteiro, andarilho pelos bairros do município, tinha uma perna atrofiada e vivia de ajutórios), Chica Pereira, Quim Pic Toc, Lazinho Matarazzo, Zé Tamanduá, Tico Carrité, Cassião das Partes, Xatu, Mandioca,  Zequinha, Adão da Serrinha, Ângelo e outros.

 

 

Já tivemos o Adão e ainda lembramos com saudades do Zequinha, mas a figura do momento é, sem dúvida, o Ângelo. Cativante, ingênuo, pacífico,infantil, inteligente, dependendo do interlocutor, da gozação ou de um pedido não atendido, mostra sua  engenhosidade. É a bola da vez…!

 

 

Pedro Cavalheiro ” Figura notável à sua época. Depois de fazer a ronda dos bares, onde se embebia de muita boa idéia, ia para um dos bancos do jardim da praça, pondo-se a dizer poesias românticas e clássicas; quase sempre de Fagundes Varela, assistidas por nós os jovens sonhadores, iniciados por ele, no romantismo caboclo. Terminada a sua declamação, vociferava, entre gestos e perdigotos: “Vocês não sabem o que é ter sentimentos”. Nunca fiquei sabendo, de onde veio? Família de quem? Como vivia? Merece uma pesquisa mais profunda a respeito”. (Gentil de Oliveira)  Pedro Cavalheiro era daqui mesmo e sempre viveu de pequenos serviços; foi ajudante em armazéns, comprador de aves e ovos, lavrador. Participou de revoluções e, antes de tudo, foi um boêmio e romântico. Seresteiro, conhecia o cancioneiro brasileiro como ninguém, cantando com desenvoltura as composições de Paraguaçu, Catulo da Paixão Cearense e J.Pernambuco. Na Revolução de 1924, foi promovido a cabo por ato de bravura. Faleceu em Porangaba em 1948.

 

 

Chica Pereira - “Conheci-a perambulando pelas ruas da cidade, com seu andar desengonçado, em virtude de deficiência física, de nascimento talvez. Com suas mãos e dedos esquálidos e sujos, se apoiando nas paredes para se locomover, enquanto proferia vitupérios. Era conhecida de todo mundo, mas eu nunca fiquei sabendo nada de sua origem, como vivia e que foi feito dela, depois que parti de Porangaba. Creio, que ela deve ser objeto de pesquisa. Afinal era uma figura marcante do inocente folclore porangabense”.  (Gentil de Oliveira)  A Chica Pereira também era porangabense. Morava numa casinha de barro, na esquina da atual rua Brás Gica da Paz com a rua Bernarda Maria da Conceição, no terreno onde está a SABESP, perto do antigo “lixo” (local onde, antigamente, era despejado o lixo recolhido na cidade). Quando a conheci, já vivia sozinha, com a ajuda de algumas pessoas; a mãe já havia morrido. Teve uma irmã, a  Leontina que faleceu bastante jovem. Gostava de bater papo e, logo que deixei Porangaba, fiquei sabendo que se tornara mãe solteira, cuja criança fora entregue à uma família de Tatui. A Chica passou seus últimos dias naquela cidade e faleceu no Asilo São Vicente de Paulo.

 

 

Jesuíno - “Precursor do uso de saia para homem. Era assim que ele se vestia; puxando uma miniatura de carro de boi, sobre o qual trazia sua mudança. Suas aparições em Porangaba eram cíclicas. Vinha, se ia, sem que a gente percebesse. Era um mulato, baixinho e gordo, muito caricato, sempre brigando com a molecada que o apupava, atirando-lhes pedras e xingamentos. Pedia comida aos moradores, ficava alguns dias na cidade e depois partia com seu carrinho para onde? Nunca fiquei sabendo”. (Gentil de Oliveira)  Depois de 1947, quando saí de Porangaba, nunca mais ouvi falar do Jesuíno, cujo nome, na minha infância,  me assustava. Muita vezes, com meus amigos de infância, chegávamos a importuná-lo nos quintais e casas abandonadas em que se instalava, mas éramos sempre expulsos com certa rudeza e debaixo de pelotadas, pois era imbatível no uso do estilingue e que jamais abandonava. Existiam momentos de trégua, quando nos aproximávamos e mantínhamos, inclusive, conversa. Era uma figura estranha, entroncado, forte, que perambulava pelas cidades da região. Ouvi dizer que era de Conchas.

 

 

Larico Babão – “Anos 30/40. Babava constantemente, ininterruptamente. Miúdo, magro, feio e dentuço. Excitado, mostrava seus grandes dentes salientes e no rosto indefinido se era de alegria ou tristeza. Perambulava pelas ruas e, quando parado, ficava sempre de cócoras observando tudo atentamente. Dormia onde lhe davam pouso, no paiol, na casinha do fundo ou em alguma fresta da casa. Gostava e muito de ficar de cócoras à porta das Igrejas de Santo Antônio e São Roque. Ali dormia acocorado fizesse frio ou chovesse. Certa feita, sentado na entrada da Igreja de São Roque, um cão lambia sua baba e ele, Larico, amaciava lentamente o seu pelo. Emulação do próprio São Roque, cuja imagem tem aos pés um cachorro. Todos na cidade o conheciam; manso, de uma mansidão cativante, serviçal, atendia a todos que o procuravam com fidelidade canina em troca de um prato de comida ou uma xícara de café. Seus pais? Ninguém sabia. Muito menos ele. Quando lhe perguntavam onde nascera, respondia: na beira do rio Feio, ao pé de uma goiabeira. Larico Babão que só consigo ver na minha saudade, beleza de minha infância, quero dizer que sou seu irmão.Nascemos na mesma cidade, na doce, terna e querida Porangaba. Somos filhos do mesmo Pai Celeste que nunca deixou de nos assistir. Larico, no céu continua a ser meu irmão.Meus 82 anos completos indicam que logo estarei perto de você, isto se Deus me quiser. Espere-me Larico,sem babação”. (Urbano de Miranda)  O Larico era de Guareí. Seu nome: Vilarino de Souza. Tipo popular, viveu muitos anos como agregado da Família Nogueira, antes com o patriarca Pedro Nogueira e depois, até sua morte ao lado do Mário Nogueira. Fazia pequenos serviços. Se provocado, e o que acontecia sempre, agia rapidamente e era hábil em atirar pedras com voracidade sinistra; a sua esquerda era certeira. Possuía também qualidades; era educado, leal, respeitava as pessoas, as famílias. Gostava de música e tocava na banda; era o bumbe

 

Quim Pic Toc - O apelido pegou e todos, na cidade, o conheciam por Quim Pic Toc.  Talvez pelo “toque” da muleta que o ajudava a caminhar. Usava somente uma.  Não me lembro qual braço a apoiava e nem da perna  atrofiada. Aleijado numa das pernas, desde criança, não tinha nenhum tipo de revolta e nem era irascível pela deformação. Contavam as pessoas íntimas que o defeito  foi em decorrência da queda de um banco, ainda na infância, cuja lesão mal tratada pelos pais, provocou o enrijecimento. Não houve atendimento médico e, por falta de recursos, foi cuidado na própria casa, na base de hervas, garrafadas e outras terapias pouco recomendáveis. O menino somente recomeçou a andar com a ajuda de um bastão e não o largou mais.  Chamava-se Joaquim Pires Lopes. Veio do sítio, do bairro dos Florentino, onde nasceu e viveu grande parte de sua vida. Já adulto, trabalhou na lavoura (capinava e roçava) e em serviços mais leves. Não carregava nenhum tipo de complexo; era  pessoa simples, produtiva. Como lazer, gostava de  jogar “bola”, sempre como goleiro. Era curioso vê-lo jogar, debaixo das traves, com arrojados saltos, numa perna só, apoiado na muleta, para alcançar a bola. Tornava-se, sempre, a atração maior. Respeitado na comunidade, participante, tinha muitas amizades. Chegou a se aposentar como trabalhador rural. Morou muito tempo numa casa da prefeitura, ao lado do velório municipal, onde era visitado e recebia a ajuda de amigos. Solteiro, faleceu em Porangaba. Era primo da Chica Pereira e do João Bunda, pessoas bastante populares da cidade.

 

 

Fábio do Bazinho - Popular, a inclusão de seu nome na relação dos atuais “tipos populares” da cidade, é uma simples homenagem para um jovem especial pela sua  força de vontade – um verdadeiro guerreiro. Fábio Eduardo é um jovem irrequieto, conhecido como Fábio da Bicicleta ou Fabião. Filho de Bazinho Spínola ( falecido) e da Célia do Tico, nasceu em 16/03/1974 na cidade de Itatinga. Ao conhecê-lo, todos, indistintamente, notam que é uma pessoa especial. É portador de necessidades especiais de nascença, mas totalmente diferenciado,  inteligente  e produtivo. Mostra  força de vontade invejável para viver e vencer obstáculos e, aos poucos,  vem dominando os problemas e tornando-se independente. Alegre e prestativo, não se abate facilmente e gosta de participar de encontros de motoqueiros ( viaja sempre, com a ajuda da família às cidades vizinhas onde são realizados os eventos). Gosta também de rock and roll  ( fã  de Bon Jovi) e de música sertaneja, os cantores Bruno e Marrone são os preferidos. Procura levar uma vida normal e merece todo o respeito e carinho da comunidade.  A sua evolução tem sido extraordinária nos últimos anos,  graças ao apoio do padrasto João Pedro, que o encaminhou para tratamentos de recuperação. Hoje, já consegue se comunicar e ser entendido.  Portador de paralisia ainda na fase de gestação, a anomalia  lhe trouxe seqüelas,  dificultando a fala, a locomoção e a sustentação, mas, gradativamente, vem melhorando. Dedicado ao trabalho, procurou ser  útil desde cedo, quando passou a vender  roupas, bijuterias,  cigarros, etc.,  a entregar jornais e panfletos. No início usava uma bicicleta adaptada e, atualmente, conduz um triciclo motorizado, que lhe  foi doado, por iniciativa da Rádio FM Porangaba, na pessoa do diretor Elias Marques, com o apoio da Prefeitura Municipal, cuja campanha envolveu grande parte da comunidade. Atualmente, vem fazendo tratamento e acompanhamento na AACD – de São Paulo, e a recuperação é visível, pois com um andador articulado, apesar das dificuldades,  já consegue se locomover sozinho.

 

Júlio Manoel Domingues

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